São cerca de 30 os conflitos hoje em acto no nosso planeta. Alguns são patentes a todos, outros são esquecidos mas não por isso menos cruéis. Violência, ódio e atitudes de disputa constatam-se muitas vezes também nos países que vivem “em paz”.
Todos os povos, todas as pessoas anseiam profundamente pela paz, pela concórdia, pela unidade. No entanto, apesar dos esforços e da boa vontade, após milénios de História, reconhecemo-nos incapazes de uma paz estável e duradoira.
Jesus veio trazer-nos a paz, mas uma paz – diz-nos Ele – que não é como a que «dá o mundo» (1), pois não é apenas ausência de guerra, de brigas, de divisões, de traumas. A “sua” paz é isso, mas também é muito, muito mais! É plenitude de vida e de alegria, é salvação integral da pessoa, é liberdade, é fraternidade no amor entre todos os povos. Ele próprio é a nossa paz (2). Por isso, pode dizer-nos:
«Dou-vos a minha paz»
E o que é que Jesus fez para nos dar a “sua” paz? Pagou-a pessoalmente. Precisamente quando nos prometia a paz, era atraiçoado por um dos seus amigos, entregue nas mãos dos inimigos, condenado a uma morte cruel e humilhante. Colocou-se entre os adversários, tomou sobre Si os ódios e as separações, abateu os muros que separavam os povos(3). Ao morrer na cruz, depois de ter experimentado por amor a nós o abandono do Pai, reconciliou os homens com Deus e entre eles, trazendo à terra a fraternidade universal.
Também hoje a construção da paz pede-nos um amor forte, capaz de amar até quem não nos retribui. Um amor capaz de perdoar, de ultrapassar o conceito de “inimigo”; de amar a pátria dos outros como a nossa. Exige que, de pessoas cobardes, concentradas talvez no que nos interessa e no que nos diz respeito, passemos a ser pequenos heróis quotidianos que, dia após dia, servindo os irmãos e as irmãs, estão prontos a dar até a vida em favor deles. Exige ainda que tenhamos coração e olhos novos para amar e ver todas as pessoas como candidatas à fraternidade universal.
Podemos perguntar: «Também os vizinhos irascíveis? Também os colegas no serviço que me impedem de subir na carreira? Também os que militam num partido diferente do meu ou torcem por uma equipa de futebol antagónica? Também as pessoas de religião ou de nacionalidade diferentes da minha?».
Sim, todos eles são meus irmãos e irmãs. A paz começa precisamente aqui, a partir do relacionamento que eu souber instaurar com cada próximo. «O mal brota do coração do homem», escrevia Igino Giordani, e «para extirpar o perigo da guerra é preciso extirpar o espírito de agressão, de exploração e egoísmo que dá origem à guerra: é preciso reconstruir uma consciência» (4).
«Dou-vos a minha paz»
Como é que Jesus nos pode dar hoje a sua paz? Ele pode estar presente no meio de nós através do nosso amor recíproco, através da nossa unidade (5). Poderemos, assim, experimentar a sua luz, a sua força, o seu próprio Espírito, cujos frutos são: amor, alegria, paz (6). A paz e a unidade caminham lado a lado.
Neste mês de Janeiro, em que rezamos de modo especial pela realização da comunhão total e visível entre as Igrejas, damo-nos conta do forte nexo entre a unidade e a paz. Nos últimos anos vimos como as Igrejas e os cristãos, individualmente, trabalharam juntos pela paz.
De facto, como poderemos testemunhar aquela paz profunda que Jesus trouxe se entre nós, cristãos, não houver a plenitude do amor, se não formos um só coração e uma só alma como acontecia na primeira comunidade de Jerusalém? (7)
O mundo só muda se nós mudarmos. É lógico que temos de trabalhar, segundo as nossas possibilidades, para solucionar os conflitos, para elaborar leis que favoreçam a convivência das pessoas e dos povos; mas é sobretudo pondo em relevo aquilo que nos une que poderemos contribuir para a criação de uma mentalidade de paz e trabalhar juntos pelo bem da humanidade.
Se testemunharmos e difundirmos valores autênticos, tais como a tolerância, o respeito, a paciência, o perdão, a compreensão, todas as outras atitudes, que contrastam a paz, desaparecerão espontaneamente.
Foi esta a nossa experiência durante a Segunda Guerra Mundial, quando nós (um pequeno grupo de jovens) decidimos viver só para amar. Éramos pequenas e tímidas, mas, logo que procurámos viver umas pelas outras, ajudar os outros a partir dos mais necessitados e servi-los, arriscando até a vida, tudo mudou. Nos nossos corações jorrou uma força nova e notámos na sociedade uma mudança de fisionomia: uma pequena comunidade cristã, semente de uma “civilização do amor”, começou a renovar-se. No fim, é o amor que vence, porque é o mais forte de tudo.
Tentemos viver assim neste mês, para sermos fermento de uma cultura nova de paz e justiça. Veremos renascer em nós e ao nosso redor uma nova humanidade.
Chiara Lubich
1) Cf. Jo 14, 27;
2) cf. Ef 2, 14;
3) cf. Ef 2, 14-18;
4) L’inutilità della guerra, Roma 2003, 2ª edição, pág. 111;
5) cf. Mt 18-20;
6) cf. Gl 5, 22;
7) cf. Act 4, 32.
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