Foi apresentado ao Parlamento Europeu, em Bruxelas (Bélgica) o documento de posições compartilhadas entre cristãos e marxistas, rumo a uma ética social comum, fruto de um longo caminho de oito anos (e dois séculos). Um projeto de diálogo transversal, é como se autodefine Dialop, trabalho que vem sendo realizado há alguns anos por cristãos e marxistas na Europa e que teve um impulso decisivo após um encontro de alguns representantes da esquerda europeia com o Papa Francisco, no Vaticano (leia também: Dialop: cristiani e marxisti al lavoro insieme). No dia 8 de novembro passado, com o apoio do grupo da Esquerda no Parlamento Europeu, em colaboração com o Movimento Político pela Unidade e New Humanity, no edifício Altiero Spinelli, reuniram-se presencialmente 40 pessoas de nove países da União Europeia, outras acompanharam, em streaming, a apresentação da carta de posicionamento “Em busca de um futuro comum em solidariedade”. O documento sobre as posições compartilhadas no diálogo cristão socialista, escrito pelo prof. Michael Brie – presidente do comitê científico da Fundação Rosa Luxemburg – e pelo sociólogo belga, prof. Bennie Callebaut, do Instituto Universitário Sophia, analisa como, tendo sido antagonistas no passado, cristianismo e marxismo vejam diante de si um outro muro a ser abatido, o muro do capitalismo selvagem, e como encontram afinidades surpreendentes no presente. Na mensagem e na pessoa do Papa Francisco percebem uma figura que une, um líder e um companheiro de viagem. “Nas lutas comuns – afirma o documento – estamos trabalhando em projetos guiados por visões compartilhadas”. O documento explica, com pistas de trabalho, quais seriam esses projetos: “uma economia da vida; uma comunidade cuidadora; uma política de transformação solidária; um mundo no qual exista espaço para muitos mundos; a dignidade de cada indivíduo em um mundo rico de bens comuns; e por um conjunto de paz”. No momento do debate se faz inevitável o questionamento sobre como tais projetos se exprimem no concreto, como expresso pelo prof. Léonce Bekemans (Cátedra Jean Monnet, Universidade de Pádua). A resposta vem de Walter Baier, de transform!europe, um dos iniciadores e coordenadores de Dialop: “Nós nos movemos em três níveis – ele explica –, o diálogo, como iniciativa cultural, para chegar a nos tornar um think tank; envolver as pessoas no trabalho pela solidariedade, como aconteceu nas iniciativas pelos migrantes e refugiados; suscitar um envolvimento em nível político, especialmente pela construção da paz”. Marisa Matjas, euro-deputada portuguesa do Bloco de Esquerda, vice-presidente do Partido da Esquerda Europeia no Parlamento Europeu, fez as honras da casa. Ela recordou vivamente as palavras do Papa Francisco aos membros do Parlamento Europeu, em 2014, “pronunciadas no momento em que mais precisávamos ouvi-las”. “Ele nos disse para manter viva a democracia na Europa, falou de ocupação e de direitos dos trabalhadores, de instrução, migração, no momento em que a UE ignorava os movimentos maciços de pessoas em chegada da Síria; falou da dignidade dos direitos humanos; temos muitas coisas em comum, sobre as quais devemos trabalhar juntos”. “Hoje temos necessidade do pão com o qual viver, de visão, de espírito, de aliança. É a hora de ter e dar esperança ‘no plural’. A isso Dialop nos convida”, afirmou o teólogo Piero Coda em seu discurso de abertura sobre “Os caminhos comuns rumo a uma sociedade global, justa e fraterna”. Um plural que exige e convida a alargar cada vez mais as alianças, não apenas ao mundo católico, mas a todo o mundo cristão, numa dimensão ecumênica. Não apenas o cristianismo, mas as religiões; não apenas a esquerda, mas as várias almas políticas que se comprometem pelo bem comum, a defesa do ambiente. Certo, é necessário o esforço inicial de colocar de lado a pretensão – citando o documento – de “possuir o monopólio da verdade”. “Uma ética social transformante e transversal deve contar com a contribuição de outros atores e tradições, juntamente com marxistas e cristãos, que estão presentes no nosso continente e tem visões do mundo diferentes”, reitera a esse respeito o padre Manuel Barrios Prieto, Secretário Geral de COMECE, incluindo o conceito de fraternidade humana, a partir da assinatura do documento de Abu Dhabi, de 1919, e da Encíclica Fratelli Tutti. Parte de Bruxelas um compromisso de diálogo renovado, com um impulso de inclusão, consciente de que o diálogo é um “trabalho em curso permanente”.
Maria Chiara De Lorenzo
0 Comments