Movimento dos Focolares

Maria Voce: construir relações com todos, esta é a contribuição essencial do Movimento dos Focolares

De que modo Maria Voce viveu seu papel como primeira presidente na liderança do Movimento dos Focolares depois de Chiara Lubich? Em entrevista concedida ao Vatican News no dia 27 de janeiro, ela falou sobre a atualidade do Movimento e sua grande sintonia com o Papa Francisco. A seguir, amplos trechos da entrevista. Com certeza, presidir uma realidade tão vasta e complexa como é o Movimento dos Focolares, do qual participam 2 milhões de pessoas em todo o mundo, em 182 países, não deve ser pouca coisa. A atual presidente cessante é Maria Voce, nascida na província de Cosenza (Itália), advogada, com estudos de Teologia e de Direito Canônico. Nos microfones do Vatican News, ela falou de sua experiência de vida durante 12 anos à frente do Movimento. Alegrias e tristezas, conquistas, talvez alguns fracassos, limites e oportunidades: a vida do Movimento provavelmente foi composta de todas essas coisas, sempre, mas também nesses últimos anos. Para dizer, de modo bem sintético, qual é realidade dele hoje, o que diria? Eu o veria como uma árvore, que talvez tenha perdido um pouco suas flores e suas folhas, talvez tenha se tornado um pouquinho como uma árvore no outono, para usar uma imagem, mas é uma árvore que mantém intacta sua raiz muito forte e essa raiz é capaz de manter em si mesma a seiva e o calor para alimentar as sementes dessa mesma árvore, que agora estão espalhadas pelo mundo inteiro, em todos os continentes. Portanto, o Movimento tem a possibilidade de continuar a alimentá-las e fazê-las brotar, como na verdade já estão brotando em muitos lugares. Atualmente nós o vemos, talvez, no inverno, no [pouco] calor do inverno, mas é no inverno que as sementes amadurecem debaixo da terra, para depois florescerem, na primavera. E me parece que é uma árvore que está preparando a nova primavera da Obra. O Papa Francisco e o Movimento dos Focolares: é evidente que existe uma grande sintonia do ponto de vista da abertura ao diálogo, da necessidade de construir um mundo diferente. Em particular, justamente o apelo do Papa à fraternidade da família humana encontra o Movimento na vanguarda do diálogo com membros de outras religiões, inclusive com os não crentes. Como a senhora vê a contribuição do Movimento neste sentido? Vejo que ela é essencial, porque sempre foi essencial em Chiara desde o início: certamente pela graça do carisma da unidade recebido do Espírito Santo, desde o início ela sentia realmente que devia encontrar cada pessoa com espírito de fraternidade, e foi isso que ela sempre fez ao conhecer alguém: os católicos em primeiro lugar – desde os bispos que a questionavam, como vimos no filme, até os pobres de Trento –, do mesmo modo como fez quando conheceu pessoas de outras Igrejas, de outras religiões ou pessoas sem nenhuma religião. Em todos Chiara encontrava irmãos e irmãs, e os tratava como irmãos e irmãs. Foi isso que Chiara nos ensinou e é isso que permanece no Movimento; e vemos que isso é uma força extraordinária. Vimos isso também nesses dias de preparação para a Assembleia, durante os quais vimos na linha de frente pessoas que pertencem ao Movimento, de várias Igrejas e religiões, ou sem um credo religioso explícito, mas de boa vontade, que se colocaram antes de mais nada a testemunhar esse poder do amor, que é capaz de criar relações em todos os níveis, que é capaz de superar os conflitos, que é capaz de fazer com que você se encontre entre pessoas de outra religião, que até ontem talvez fossem inimigas umas das outras, e que, como pessoas, se encontram e falam juntas, rezam juntas, procuram juntas o sentido da vida, o sentido da pandemia, o sentido de viver para os outros, de realizar ações de solidariedade para os outros. Vimos isso nas palavras de sabedoria dessas pessoas, na sua atenção para com aquilo que o Movimento está preparando, na sua participação ativa em preparação à assembleia com suas sugestões, com suas vidas, porque evidentemente foram inspiradas pelo mesmo Espírito Santo que age para além das fronteiras, para além de todas as barreiras. Portanto, tenho a impressão de que esta é a contribuição que o Papa sente e com a qual ele pode contar. E não apenas o Papa, mas toda a Igreja e toda a humanidade, porque se sente que há uma necessidade extrema dessa fraternidade e que o Movimento tem uma graça especial para construí-la, justamente por causa do carisma de unidade que vem de Chiara. Falando em relacionamento. A senhora disse recentemente algo muito forte, ou seja, entendeu que é necessária uma reviravolta para o Movimento: entender que Deus não é apenas Amor, mas também Trindade… Certamente Deus é Trindade; isso significa que Deus em si mesmo é relação. Portanto, significa que todos aqueles que buscam a Deus devem construir relacionamentos para encontrá-lo. E eu não acredito que haja alguém que não busque a Deus: poderá estar buscando a verdade, mas Deus também é verdade; estará buscando a beleza, mas Deus também é beleza; estará buscando a bondade no mundo, mas Deus também é bondade; Deus é tudo o que qualquer ser humano possa buscar e pode encontrar se construir relacionamentos. E eu acredito que todos são capazes disso, porque todos são criados à imagem de Deus e, portanto, à imagem de Deus Trindade. Por estatuto, a Obra de Maria terá sempre uma mulher como presidente. Acredito que o Movimento é uma das poucas realidades em que ser mulher é uma vantagem, poderíamos dizer. Mas é também um ótimo sinal para a sociedade civil e também para a Igreja… Devo dizer que fico perplexa diante desta palavra “vantagem”. Porque, para dizer a verdade, estar à frente de um Movimento como o nosso significa realmente ser a primeira pessoa a servir, a primeira a multiplicar os atos de amor, a primeira a aceitar qualquer desafio, qualquer coisa e a superá-la com a ajuda de Deus e com a ajuda dos irmãos. Portanto, em certo sentido, pode ser uma vantagem ser considerado capaz de ser eleito, mas não me parece que nós vivemos isso com esse espírito. E não me parece que as focolarinas, que são as únicas que podem aspirar a isso, se assim quisermos dizer, vivem isso dessa maneira; mas o vivem, sim, com um espírito de amor e de serviço à Obra de Chiara, que todos querem continuar servindo com o amor com o qual Chiara a amou, guiou e serviu. Mas além disso, penso que isso é, certamente, também um testemunho daquela igualdade, daquela fraternidade profunda, daquela igual dignidade, que vai além das diferenças sexuais, que Deus trouxe ao mundo quando criou o ser humano à sua imagem e o criou homem e mulher. Portanto, ambos unidos nessa complementaridade que deve respeitar a diversidade e, portanto, deve revelar tanto um como o outro na própria capacidade de doação. Capacidade que certamente deve ser diferente, porque Deus fez dois seres diferentes, mas feitos para estarem juntos e para constituírem juntos a humanidade, segundo a Sua imagem e semelhança. Nesse sentido, penso que é um sinal de progresso e é algo que está emergindo cada vez mais, tanto na Igreja como na sociedade. Mas penso que não é nada mais do que a manifestação cada vez mais clara daquilo que é o “perfil mariano” da Igreja, aquele perfil que remete a Maria, que é mulher, mãe, mas também rainha, também fundadora da Igreja no Calvário, juntamente com seu Filho, corredentora da humanidade, princípio de unidade para todos. Nesse sentido, então, penso que sim, que é um privilégio do qual o Movimento pode se gabar e que ele pode oferecer à Igreja e ao mundo, de certa forma, como um exemplo e como precursor. O que Maria Voce deseja hoje à Obra de Maria para o futuro? Como Chiara, desejo à Obra o máximo de fidelidade ao Evangelho, ou seja, uma fidelidade que pode chegar até o heroísmo, porque é uma fidelidade à vivência concreta do Evangelho. E eu diria a esta Obra que prossegue seu caminho, fidelidade àquela palavra do Evangelho que Deus quis pronunciar enviando este carisma, isto é, a palavra “unidade”. Portanto, fidelidade àquela unidade que deve ser total, que deve ser capaz de viver relações como as que se vivem na Trindade, para testemunhar ao mundo que Deus existe, que através da Obra Ele ainda pode espalhar a fraternidade mais amplamente na Igreja e no mundo para contribuir à realização daquela oração de Jesus: “Pai, que todos sejam um”.

Adriana Masotti

Aqui a entrevista integral

Uma vida pela paz na Terra Santa

Uma vida pela paz na Terra Santa

20170628-01Junho de 1967. Precisamente cinquenta anos atrás os israelenses ocupavam os territórios palestinos. A partir daquele dia, uma sequência de embates violentos e de mortes. Muitos, apesar de tudo, continuam a construir um futuro de paz. Entre estes, Margaret Karram, que foi membro da Comissão episcopal para o diálogo inter-religioso da Assembleia dos Ordinários Católicos da Terra Santa, e colaboradora na direção do Conselho de Coordenação Inter-religiosa, em Israel (ICCI). Desde 2014 trabalha no Centro Internacional do Movimento dos Focolares (Itália). Margaret K.: «Nasci em Haifa, uma cidade na Galileia, e a minha sempre foi uma terra de conflitos, guerras, sob a dominação de vários povos. A nossa casa estava localizada no Monte Carmelo, num bairro judaico. Éramos a única família árabe, cristã católica, de origem palestina. Lembro que ainda pequena, eu tinha seis anos, algumas crianças começaram a me dirigir ofensas pesadas, dizendo que eu era árabe e não podia morar naquele bairro. Corri até minha mãe, chorando, perguntando o porquê daquela situação. Sua única resposta foi fazer um convite àqueles meninos para virem à nossa casa. Ela tinha preparado um pão árabe e deu a eles, dizendo que o levassem às suas famílias. Desse pequeno gesto nasceram os primeiros contatos com os vizinhos judeus, que quiseram conhecer a mulher que tinha uma atitude deste tipo. Este fato me ensinou que um pequeno ato de amor para com o próximo leva a superar montanhas de ódio». Margaret continua narrando lembranças e acontecimentos que testemunham quantas dificuldades teve que enfrentar. Árabe, cristã-católica, Margaret é cidadã israelense. Muitos de seus familiares, como tantos outros cristãos, precisaram fugir para o Líbano durante os anos da guerra. Sendo assim não pode conhecer grande parte da sua família, já que o seu pai decidiu permanecer perto dos pais. Cada vez mais aumentava nela o desejo de construir pontes de fraternidade. «Desde pequena eu sonhava com a paz. Muitas vezes eu ia aos bairros árabes de Jerusalém, a Belém ou a outros territórios palestinos. Se eu falava árabe – que é a minha primeira língua – as pessoas reconheciam pelo meu sotaque a proveniência da Galileia, que está em território israelense. E se eu falava em hebraico eles notavam que eu tinha um sotaque diferente deles. Isso criou em mim um sentimento de ter perdido a minha identidade: eu não era nem palestina, nem israelense. Aos 15 anos eu conheci o Movimento dos Focolares, e a espiritualidade de Chiara Lubich colocou em mim asas para voar. Senti que não devia mudar as pessoas, mas mudar a mim mesma, o meu coração. Eu voltei a acreditar que o outro é uma dádiva para mim, como eu o posso ser para os outros. Jerusalem, panorama of Wailing wall and Mousque of Al-aqsa in Jerusalem, Israel Morando em Jerusalém muitas vezes tinha a tentação de perder a coragem, especialmente durante a Intifada. Vivemos momentos muito duros na cidade: havia frequentes atentados nos locais públicos, inclusive nos ônibus que eu usava todos os dias para ir ao trabalho. Eu tinha medo. Só consegui ir para frente pelo fato de ter comigo uma comunidade que compartilhava a espiritualidade do Focolare. E finalmente encontrei a minha verdadeira identidade: a de ser cristã, católica, testemunha de esperança. Foi uma etapa importante na minha vida, que me libertou dos medos e incertezas. Eu podia amar a todos, árabes e israelenses, respeitando suas histórias, e fazer de tudo para criar espaços de diálogo, para construir pontes, confiança; assisti a pequenos milagres, vi pessoas, judias e muçulmanas, mudarem sua atitude e procurarem agir juntas pela paz». Existem, certamente, tantas iniciativas. Muitas organizações trabalham pela paz por meio da arte, da educação, de ações sociais. Muitas pessoas, como Margaret, procuram acender pequenas luzes que podem iluminar a escuridão e descortinar nesgas de céu. Em junho de 2014 Margaret foi convidada a tomar parte da delegação cristã na oração de “invocação pela paz”, feita pelo Papa Francisco, o Patriarca Bartolomeu I, Shimon Peres, então presidente de Israel, e Abu Mazen, presidente da Palestina. «Logo após este encontro desencadeou-se a guerra na Faixa de Gaza. Parecia que tinha sido em vão a tentativa do Papa de reunir os dois Chefes de Estado para trabalhar pela paz entre os dois povos. Mas foi um momento histórico, uma etapa importante. Percebi a potência da oração e entendi que somente Deus pode mudar o coração dos homens. Devemos continuar a invocar de Deus a paz. Como as oliveiras que plantamos naquele dia, que a paz lance raízes e se possam ver os frutos». Vídeo integral (em língua italiana)

Elisa e Gabriele, no dia eterno após o terremoto

Elisa e Gabriele, no dia eterno após o terremoto

ElisaCom a sua família completa – um irmão gêmeo e um mais velho, mãe, pai, as avós – Elisa esteve algumas semanas antes na Mariápolis – o encontro marcado dos Focolares no verão – com uma centena de pessoas. A ocasião de se conhecer, trocar experiências de vida, percorrer um trecho de estrada juntos. Elisa, depois, todos se lembram dela: com o seu modo de ser alegre e contagioso, e com a ajuda do irmão gêmeo, quis filmar as impressões do seu grupo antes de partir, porque «as Mariápolis são experiências que marcam no coração e são coisas que permanecem. Espero conseguir voltar sempre», como escreveu para a mãe num bilhete ao voltar para casa. Gabriele-01Gabriel, o priminho de 8 anos, ao invés, na metade de junho participou – pelo segundo ano consecutivo – do “congressinho Gen4”. Três dias vividos no encanto das crianças que, mais do que outros, entendem “as coisas de Deus”. Uma foto o mostra enquanto faz o papel de um anjinho que toca a trombeta na passagem pela Porta da Misericórdia, junto com outros colegas. Na manhã de 24 de agosto, a notícia do terremoto e o suspense: Elisa, Gabriel e as avós, estão debaixo dos escombros e se teme pela vida deles, como pelos muitos outros desaparecidos de que não se têm notícias. Uma corrente de orações parte imediatamente como um tambor na selva, mas ao fim da tarde chega a confirmação: não sobreviveram. As famílias dão imediatamente um forte testemunho: «A fé que eles têm no amor de Deus, tão firme inclusive em tamanho sofrimento, nos ilumina a viver com renovado vigor por aquilo que não passa», escreverá Maria Voce, presidente dos Focolares, no dia seguinte do terremoto às comunidades e às famílias atingidas pelo abalo sísmico. Enquanto as comunidades dos Focolares na Itália e no mundo se mobilizam para apoiar a máquina dos socorros.

Elisa con i fratelli

Elisa e seus irmãos

A dor é incompreensível inclusive para os muitos coetâneos, colegas de escola, os jovens do Movimento Juvenil pela Unidade que conheceram Elisa nos acampamentos de verão, durante experiências inesquecíveis. Mas o testemunho que procuram dar, juntos, é o de um amor que seja mais forte até mesmo do que a própria morte. Uma delas escreve: «Oi Elisa, nesta noite sonhei com você, estávamos em Stop’nGo, o acampamento de verão onde ficamos amigas. Queria lhe saudar pela última vez. Você ainda tinha no pulso o bracelete que eu fiz para você. Eu lhe disse que era belíssima, parecia que você subestimava a sua beleza, portanto eu tinha que lhe lembrar isto. Depois deste sonho acordei mais serena, imagino você no Paraíso». «Lamento todos os desgostos que lhe causei – escreve o irmão gêmeo –; você se lembra de quando estávamos na casa do vovô e você assumia a culpa no meu lugar? Agora os escombros deste terremoto me afastaram de você. Eu lhe suplico, meu anjo, me proteja daí do alto». «Mas como se pode pensar que não existe mais? Elisa tirou o meu nome no jogo do Anjo da Guarda durante a Mariápolis de verão de 2014». Quem escreve é pe. Marco Schrott, que conhece as famílias de Elisa e Gabriel há anos e que, com eles, sempre teve um relacionamento especial. «Sendo o meu Anjo da Guarda, eu a via sempre ao meu redor me superando em criatividade com mil atenções. Em casa, no whatsapp, na igreja, no campo stop&go e em todas as circunstâncias havia sempre uma frase espirituosa que lembrava a guarda recíproca. Como se pode imaginar que tenha acabado? Certamente será preciso outro alguém que brinque com as crianças menores e que as console no seu lugar. Elisa poderá só se multiplicar, não desaparecer».
Gabriele in Mariapoli

Gabriele na Mariapolis

E de Gabriel, sempre pe. Marco escreve: «Aqueles oito anos normais da sua existência se descobrem totalmente cheios de alegria. Aquele menino sabia brincar sempre e com todos. Convidava, propunha, organizava e desempenhava com a máxima exatidão cada um de seus jogos e brincadeiras, como se fosse a sua única tarefa. Como todos em férias, tinha um caderno escolar com as tarefas de casa e para concluí-lo devia completar cinco páginas por dia. Mas por brincar não as tinha concluído. Depois que o pai, por telefone, o convidou a recuperar todas as páginas que ficaram para trás, se lançou logo em fazê-las. Era sempre assim disciplinado: se divertir é bom, mas o empenho sem enganar no jogo, é o mesmo para a oração e todas as outras incumbências solicitadas para colaborar dentro e fora de casa. O empenho com o qual participava das procissões, agora se entende que era fruto de uma fé madura. Portanto, não é por acaso que foram vistas longas filas nos confessionários após os seus funerais. Foram vistas as faces dos amigos tão transformadas, transtornadas, atingidas por um choque elétrico evangélico e desejosas de mudar o encaminhamento da vida, abertos à fé». Elisa e Gabriel quiseram ficar com as duas avós ainda só por aquela noite, mas antes de dormir pensaram em fazer bem as malas, de modo que estivessem prontos para a viagem no dia seguinte. Aquele dia para eles é eterno.

Terremoto na Itália, segundo dia

Terremoto na Itália, segundo dia

Terremoto_c«Estamos no dia seguinte do terremoto que sacudiu todo o centro da Itália. Enquanto estamos escrevendo, o número das vítimas – infelizmente destinado a aumentar -, é de 247 pessoas. Muitas delas eram crianças porque nos lugarejos mais atingidos – Amatrice, Accumoli, Arquata e Pescara del Tronto -, frequentemente no verão, neste período na Europa, os pais deixam os filhos com os avós enquanto eles estão trabalhando. Mais de 4 mil são as pessoas que tiveram que deixar as próprias casas, nas duas regiões mais atingidas pelo terremoto: Lácio e Marcas. Os abalos, alguns ainda de uma certa magnitude, não param». «A generosidade dos voluntários que chegaram logo e em grande número nos vários locais, empenhados em escavar sem descanso, primeiramente com as mãos, depois com as pás e enfim com meios sofisticados na tentativa de identificar qualquer mínimo sinal de vida proveniente dos escombros, é o melhor rosto desta tragédia que, na medida em que passam as horas, assume dimensões cada vez maiores, pelo número das vítimas, dos feridos, das casas despedaçadas por terra, com cidadezinhas que não existem mais. Imediata também a disponibilidade das pessoas comuns, empenhadas na coleta de bens de primeira necessidade, em fila nos hospitais para doar sangue, desejosas de ir aos acampamentos de desabrigados para levar um alívio». «Desde as 3h30 de ontem, despertados pelo primeiro forte abalo, seguimos ao vivo o desenrolar dos eventos, em contato constante com as numerosas pessoas do Movimento que moram nestas regiões: nós nos alegramos porque um gen e seu avô foram tirados vivos dos escombros, assim como o sogro e a cunhada de uma focolarina casada; ficamos o dia inteiro com o fôlego suspenso por Rita, que com os seus dois netos, Elisa de 14 anos e Gabriel de 12 e a outra avó, ao invés, ficaram soterrados. Só à noite nos chegou a mensagem da mãe que escreveu: “Subiram todos até Jesus”. Outros membros do Movimento, presentes pelas férias em Amatrice, conseguiram se pôr a salvo». «Para todos foi uma ocasião de se estreitar em unidade e viver uns pelos outros. Da Úmbria, depois, nos escrevem: «Caríssimos, obrigado pelas orações e unidade de vocês, que se difundiram numa corrente, em todo o Movimento na Úmbria, nos sustentando nesta noite de abalos sísmicos e de medo. Sentir que estávamos todos vivos nos fez agradecer a Deus e imediatamente o pensamento foi para quem estava e está sob os escombros e para quem perdeu tudo. O fato de nos termos posto imediatamente em rede nos sustentou e, em tempo real, tínhamos notícias inclusive das cidades mais atingidas. Elisabete, de Assis, nos disse que a mensagem chegou no momento mais difícil dando-lhe força e paz. Nós nos sentimos mais do que nunca uma família. Os gen estão em rede, prontos para dar um apoio e estão se desdobrando para ir ajudar nas cidades particularmente atingidas. Também os adultos estão prontos para intervir e dar uma ajuda concreta. Por enquanto, asseguramos as orações aos familiares que sofreram grandes perdas». «Com efeito, de imediato, se passou a voz das mensagens sobre as necessidades e as possibilidades de ajuda, primeiramente em conexão com a Defesa Civil, e com outros. Assim, por exemplo, em Áscoli, onde juntamente com outras associações com as quais já colaboramos, se promoveu a coleta de víveres e roupas; igualmente no Lácio; os habitantes do Abruzzo, “especialistas” após o terremoto de Áquila (2009), começaram um mapeamento de possíveis alojamentos para os desabrigados; também de outras regiões chegaram ofertas de ajuda». «Continuemos a nos manter conectados com todos e a entender pouco a pouco de que modo podemos dar uma resposta concreta a esta grande dor, no qual vemos um “semblante” de Jesus abandonado».

Junho de 2002

A atitude de Jesus era tão nova diante da mentalidade comum que, muitas vezes, por assim dizer, escandalizava as pessoas de bem. Como aconteceu quando ele convidou Mateus a segui-lo e depois foi almoçar com ele. Mateus era um cobrador de impostos. Por causa do seu ofício, o povo não só não gostava dele mas o considerava um pecador público, um inimigo a serviço do Império Romano.
Por que – questionam os fariseus – Jesus come com um pecador? Não é melhor manter distância de certas pessoas? Essa pergunta torna-se para Jesus uma ocasião de explicar que ele quer ir ao encontro justamente dos pecadores, assim como um médico vai ao encontro dos doentes; e ele conclui dizendo aos fariseus que procurem estudar o significado da palavra de Deus pronunciada no Antigo Testamento pelo profeta Oséias: “Desejo a misericórdia e não o sacrifício”.
Por que Deus quer de nós a misericórdia? Porque deseja que sejamos como ele. Devemos assemelhar-nos a ele assim como os filhos se assemelham ao pai e à mãe. Ao longo de todo o Evangelho, Jesus nos fala do amor do Pai para com os bons e os maus, para com os justos e os pecadores. Deus ama cada um, não faz distinções e não exclui ninguém. Se ele tem alguma preferência, é por aqueles que, aparentemente, menos merecem ser amados, como é o caso do filho pródigo da parábola.
“Sede misericordiosos – explica Jesus – como vosso Pai é misericordioso”: esta é a perfeição.

«Ide, pois, aprender o que significa: 'Desejo a misericórdia e não o sacrifício'.»

Também hoje Jesus dirige a cada um de nós o convite: “Ide, pois, aprender…” Mas, ir para onde? Quem poderá nos ensinar o que significa ser misericordioso? Uma única pessoa: só ele, Jesus, que foi à procura da ovelha perdida, que perdoou aos que o tinham traído e crucificado, que deu sua vida pela nossa salvação. Para aprendermos a ser misericordiosos como o Pai, perfeitos como ele, precisamos olhar para Jesus, que é a plena revelação do amor do Pai. Ele disse: “Quem me viu, viu o Pai”.

«Ide, pois, aprender o que significa: 'Desejo a misericórdia e não o sacrifício'.»

Por que a misericórdia e não o sacrifício? Porque o amor é o valor absoluto que dá sentido a todo o resto, também ao culto, também ao sacrifício. Com efeito, o sacrifício mais agradável a Deus é o amor concreto para com o próximo, que encontra a sua expressão mais alta na misericórdia.
Misericórdia que ajuda a ver sempre novas as pessoas com as quais vivemos a cada dia, na família, na escola, no trabalho, sem nos lembrarmos mais dos seus defeitos, dos seus erros; que não nos leva a julgar mas a perdoar as injustiças sofridas. Mais ainda: a esquecê-las.
O nosso sacrifício não consistirá tanto em fazer longas vigílias e jejuns, dormir no chão, mas em acolher sempre no nosso coração qualquer um que passe ao nosso lado, seja ele bom ou mau.
Foi isso que fez um senhor que trabalhava no setor de recepção e caixa de um hospital. O seu povoado tinha sido inteiramente incendiado pelos seus “inimigos”. Um belo dia viu chegar um homem com um parente doente. Pelo seu sotaque descobriu logo que se tratava de um dos “inimigos”. Ele estava assustado; não queria revelar a sua identidade para não ser mandado embora. O caixa não lhe pediu os documentos e lhe ajudou, apesar de ter que se esforçar para superar o ódio que há tempo remoía dentro dele. Nos dias seguintes teve a possibilidade de dar-lhe assistência em diversas ocasiões. No último dia de internação o “inimigo” foi pagar a conta e disse ao caixa: “Preciso lhe confessar uma coisa que você não sabe”. E ele: “Desde o primeiro dia sei quem é você”. “E por que você me ajudou, se eu sou um 'inimigo' seu?”
Assim como aconteceu com ele, também para nós a misericórdia nasce do amor que sabe sacrificar-se por quem quer que seja, conforme o exemplo de Jesus, que chegou ao ponto de dar a vida por todos.

Chiara Lubich