Movimento dos Focolares

Reflexão de Chiara Lubich sobre a Palavra de vida do mês janeiro de 2006

“Emanuel”, “Deus-conosco!”. Esta é a grande, extraordinária notícia com a qual inicia o Evangelho de Mateus. Em Jesus, o Emanuel, Deus desceu em nosso meio.
Depois, o Evangelho termina com uma promessa ainda maior e surpreendente: “Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos”.

A presença de Deus entre nós não se limitou a um período histórico, à permanência física de Jesus na terra. Ele continua conosco para sempre.

Como é que Ele permanece? Onde podemos encontrá-lo?

A resposta está justamente no centro do Evangelho de Mateus, lá onde Jesus nos deixa as linhas de vida para a sua comunidade, a Igreja. Dela, Ele falou muitas vezes: afirmou que ela é edificada sobre a rocha de Pedro; Ele a vê recolhida pela sua palavra e reunida ao redor da Eucaristia… Mas neste trecho Ele revela a identidade da Igreja no sentido mais profundo: a Igreja é Ele mesmo, presente entre aqueles que estão reunidos em seu nome.
Então, podemos tê-lo sempre presente entre nós, podemos fazer a experiência de Igreja viva, viver a realidade constitutiva da Igreja.

“Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, eu estou ali, no meio deles.”

Se é verdade que Ele, o Senhor Ressuscitado, é quem une os fiéis a si e os reúne entre si, e faz de todos o seu corpo, qualquer divisão nas nossas famílias e nas nossas comunidades altera a imagem da Igreja. Cristo não é dividido. Um Cristo fragmentado se torna irreconhecível, desfigurado.

Isso vale também para os relacionamentos entre as diversas Igrejas e comunidades eclesiais. O caminho ecumênico nos tornou conscientes de que “o que nos une é muito mais forte do que aquilo que nos separa”. E embora ainda permaneçam alguns aspectos da doutrina e da práxis cristã nos quais ainda não existe unidade na fé, desde já “o elemento mais importante de nossa unidade é a presença de Cristo ressuscitado”.
O fato de nos reunirmos em nome de Jesus para fazermos a oração em comum, para conhecermos e compartilharmos as riquezas da fé cristã, para nos pedirmos perdão mutuamente é a premissa que nos levará a superar muitas divisões. Essas iniciativas podem parecer pequenas, mas “nada é pequeno se for realizado por amor”. Jesus entre nós, “fonte de nossa unidade”, nos indicará “como podemos ser os instrumentos da unidade que Deus deseja para nós”.

Assim escrevem a Comissão Fé e Constituição do Conselho Mundial de Igrejas e o Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos, ao propor esta “Palavra de Vida”, cujo material foi preparado por um grupo ecumênico de Dublin, na Irlanda. Com efeito, desde 1968 vivemos todos juntos, durante a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos, uma mesma “Palavra de Vida”, o que já é um sinal e uma esperança para o caminho rumo à comunhão plena e visível entre as Igrejas.

“Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, eu estou ali, no meio deles.”

Mas, o que significa estarmos unidos no nome de Jesus?
Significa estarmos unidos Nele, na sua vontade. E nós sabemos que o seu maior desejo, o “seu” mandamento é que entre nós exista o amor mútuo. Por isso, onde duas ou mais pessoas estiverem prontas a se amarem desta forma, prontas a pospor qualquer coisa para merecer a Sua presença, tudo ao redor muda. Jesus poderá entrar nas casas, nos ambientes de trabalho e de estudo, nas câmaras legislativas e nos estádios, e transformá-los.

A Sua presença será luz para a solução dos problemas, será criatividade para enfrentar novas situações pessoais e sociais, será coragem para continuar fiel às decisões mais árduas, será fermento para a existência humana na multiplicidade de suas expressões.

A Sua presença espiritual, mas real, estará ali: nas famílias, entre os operários nas fábricas, nas oficinas, nos canteiros de obras; estará com os agricultores nos campos; estará entre os comerciantes, entre os funcionários públicos, em todos os ambientes.

Jesus que vive entre nós por meio do amor recíproco, renovado e declarado continuamente, se fará novamente presente neste mundo e o libertará das suas novas formas de escravidão. E o Espírito Santo abrirá novos caminhos.

“Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, eu estou ali, no meio deles.”

Pela nossa experiência podemos dizer, com gratidão a Deus, o quanto é verdadeiro aquilo que eu escrevi muitos anos atrás: se estamos unidos, Jesus está entre nós. E isto vale! Vale mais do que qualquer outro tesouro que nosso coração possa ter: mais do que a mãe, o pai, os irmãos, os filhos. Vale mais do que a casa, o trabalho, os bens; mais do que as obras de arte de uma grande cidade como Roma; mais do que os nossos afazeres, mais do que a natureza que nos circunda com as flores e os campos, o mar e as estrelas; vale mais do que a nossa alma!

Como é grande, por exemplo, diante do mundo, o testemunho do amor mútuo, segundo o Evangelho, entre um católico e um armênio, entre um metodista e um ortodoxo!

Portanto, vivamos também hoje na caridade a vida que Ele nos dá momento por momento.
O amor fraterno é mandamento fundamental. Por isso, tem valor tudo aquilo que é expressão de sincera caridade fraterna. E nada daquilo que fazemos vale, se não contiver o sentimento de amor pelos irmãos: pois Deus é Pai e tem no coração sempre e unicamente os filhos.

Vivamos para ter Jesus sempre conosco, para levá-lo ao mundo que não conhece a sua paz.

 

Chiara Lubich

 

Reflexão de Chiara Lubich sobre a Palavra de vida do mês dezembro de 2005

Esse grito de esperança de Isaías ecoa em meio ao povo de Israel, que há 50 anos se encontra no exílio da Babilônia, na Mesopotâmia. Enfim o Senhor manda um mensageiro para anunciar a libertação, o retorno à pátria! Assim como nos tempos da escravidão no Egito, Deus se colocará à frente do seu povo e o reconduzirá à Terra Prometida. Portanto, é preciso aplainar os caminhos, preencher as depressões, tornar viáveis as veredas intransitáveis, exatamente como se fazia quando um rei queria visitar uma de suas províncias.

Cinco séculos depois, às margens do rio Jordão, João Batista retoma o alegre anúncio do profeta Isaías, proclamando que desta vez está chegando o Messias em pessoa.

“Abri caminho para o Senhor! (…) rasgai estrada para o nosso Deus!”

Todo ano, quando chega o Natal, ouvimos este convite. Deus que, desde sempre, manifestou o ardente desejo de estar com os seus filhos, vem “morar entre nós”. Também hoje Ele está à porta e bate, pois deseja entrar, deseja “tomar a refeição” conosco.

Freqüentemente nós mesmos sentimos o desejo de encontrá-lo, de tê-lo como companheiro no caminho da vida para sermos inundados pela sua luz. Mas, para que ele possa entrar na nossa vida, é preciso remover os obstáculos. Já não se trata mais de rasgar as estradas, mas de abrir-lhe o coração.

O próprio Jesus enumera algumas das barreiras que fecham o nosso coração: “roubos, homicídios, adultérios, ambições desmedidas, perversidades, fraude, devassidão, inveja, calúnia, orgulho…”. Às vezes é o rancor contra parentes ou conhecidos, são os preconceitos raciais, é a indiferença diante das necessidades de quem está ao nosso lado, a falta de atenção e de amor na família…

Diante de tantos obstáculos que impedem o encontro com Deus, eis novamente o convite:

“Abri caminho para o Senhor! (…) rasgai estrada para o nosso Deus!”

Como podemos preparar-lhe concretamente o caminho?

Pedindo perdão toda vez que nos damos conta de que levantamos uma barreira, dificultando a comunhão com Ele.

É um ato sincero de humildade e de verdade com o qual nos apresentamos a Ele tais como somos, declarando a nossa fragilidade, os nossos erros, os nossos pecados.

É um ato de confiança com o qual reconhecemos o seu amor de Pai “misericordioso e rico em bondade”.
É a expressão do desejo de melhorar e de recomeçar.

Esse pedido de perdão pode ser feito à noite, antes de nos recolhermos: é o momento mais propício para dar uma parada, rever o dia que passou e pedir-lhe perdão.

Também podemos viver com maior consciência e intensidade o momento inicial da Celebração Eucarística quando, junto com a comunidade, pedimos perdão pelos nossos pecados.

Podemos ainda contar com a enorme ajuda da confissão pessoal, que é o sacramento do perdão de Deus. É um encontro com o Senhor, ao qual podemos doar todos os erros cometidos. Dali saímos salvos, com a certeza de termos sido renovados e com a alegria de nos redescobrirmos verdadeiros filhos de Deus.

É o próprio Deus que, com o seu perdão, elimina cada obstáculo, que “aplaina os caminhos” e que estabelece novamente o seu relacionamento de amor com cada um de nós.

“Abri caminho para o Senhor! (…) rasgai estrada para o nosso Deus!”

Foi isso que Luísa experimentou. Sua vida foi bem atribulada, com o grupo de amigos, a droga, a devassidão moral. 
Mais tarde ela tenta dar a volta por cima, e consegue libertar-se da dependência química. Mas a essa altura já está irremediavelmente marcada: depois de um casamento civil apressado, aparecem os primeiros sintomas da Aids. O marido a abandona.

Luísa fica sozinha com o peso dos seus fracassos. Até que um dia encontra um grupo de cristãos que vivem a Palavra de Deus e compartilham as experiências vividas. Assim, ela descobre um mundo que ainda não conhecia. Agora que encontrou um Deus que é Pai, que é Amor, ela não pode mais conservar os próprios pecados para si, mas crê no seu perdão. Sua vida muda: sentindo-se perdoada, embora no sofrimento e na doença, ela experimenta uma alegria que nunca tinha provado. Seu rosto irradia uma beleza que não diminui com o progresso do mal. Os médicos ficam surpresos com a sua serenidade.
Ela vive um novo nascimento.
No dia da sua morte ela é vestida de branco, conforme seu desejo. O caminho estava aplainado para o Encontro, para o Céu.

 

Chiara Lubich

 

(mais…)

Novembro de 2005

Com a bem-aventurança da mansidão, Jesus propõe um novo tipo de provocação: oferecer a outra face, fazer o bem a quem nos faz o mal, dar o manto a quem nos pede a túnica… Essa atitude vence o mal com o bem. A todos os que vivem assim, Jesus faz uma grande promessa:

“… receberão a terra em herança.”

Na promessa da terra podemos entrever uma outra pátria, a mesma que Jesus, na primeira e na última bem-aventurança, chama de “Reino dos céus”: a vida de comunhão com Deus, a plenitude da vida que nunca terá fim.
Quem vive a mansidão é feliz desde agora, porque já experimenta a possibilidade de transformar o mundo ao seu redor, sobretudo mudando os relacionamentos. Numa sociedade onde muitas vezes impera a violência, a arrogância, a prepotência, ele se torna “sinal de contradição” e irradia justiça, compreensão, tolerância, delicadeza, valorização do outro.

Os mansos, enquanto trabalham na edificação de uma sociedade mais justa e mais verdadeira, ou seja, evangélica, se preparam para receber em herança o Reino dos céus e para viver “nos céus novos e na nova terra”.

“Felizes os mansos, porque receberão a terra em herança.”

Para saber como viver esta palavra de vida, basta ver como Jesus viveu, Ele que disse: “Aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração”. Na sua escola, a mansidão aparece como uma qualidade do amor. Com efeito, o amor verdadeiro, que o Espírito Santo infunde nos nossos corações, é “alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, lealdade, mansidão, domínio de si”.

Certamente, quem ama não se agita, não tem pressa, não ofende, não insulta.

Quem ama se domina, é meigo, é manso, é paciente.

A “arte de amar” sobressai em todo o Evangelho. Muitas crianças também a aprenderam. Sei que brincam com um dado especial, conhecido como “o dado do amor”. Cada um de seus lados traz uma frase que ensina a amar, seguindo o ensinamento de Jesus: amar a todos; amar-se mutuamente; ser o primeiro a amar; “fazer-se um” com o outro; amar Jesus no outro; amar o inimigo. No início do dia jogam o dado e depois procuram colocar em prática a frase sorteada. E em seguida contam as próprias experiências.

Um dia, o pai de Francisco (um menino de três anos que mora em Caracas, Venezuela) chega em casa chateado por causa de um desentendimento com um colega de trabalho. Ele conta tudo à esposa, e também ela fica aborrecida com aquele homem. Francisco vai buscar o seu dado e diz: “Joguem o dado do amor!”.
Eles o jogam juntos. Na face do dado aparece “Amar o inimigo”.
Os pais entendem…

Se observarmos ao nosso redor, notaremos que existem pessoas que vivem no dia-a-dia uma maravilhosa mansidão.

Grandes personalidades que já deixaram esta terra – como João Paulo II, Madre Teresa de Calcutá, Roger Schutz – irradiaram a mansidão de tal maneira que influíram na sociedade e na história, e nos encorajam na nossa caminhada.

Chiara Lubich

Palavra de vida do mês outubro de 2005

É uma frase magistral, que projeta a nossa vida em Deus; e de lá, com a luz e a força que irradia, ela nos lança a serviço da humanidade. É a resposta que Jesus dá a uma pergunta formulada por um grupo de fariseus e por alguns homens de Herodes: deve-se ou não pagar o tributo às forças de ocupação romana? Essa pergunta era um estratagema para fazê-lo cair numa cilada. Se Jesus respondesse que sim, os fariseus o acusariam de colaboracionismo com o inimigo e assim Ele perderia a confiança do povo. Se respondesse que não, os herodianos, ligados à autoridade romana, diriam que Ele é um subversivo e o acusariam de ser agitador. Então Jesus pede para ver a moeda de prata com a qual se pagava o imposto e pergunta de quem são a imagem e a inscrição gravadas nela. Eles respondem que são do imperador. Se são do imperador, continua Jesus, que devolvam então a César aquilo que é de César. Desta forma Ele reconhece o valor do Estado e de suas instituições. Porém, sua resposta vai bem mais além, indicando aquilo que realmente é importante: devolver a Deus o que já é dele. Da mesma forma que na moeda romana está gravada a imagem do imperador, também no coração de cada ser humano está impressa a imagem de Deus: Ele nos criou à sua imagem e semelhança! Portanto, nós lhe pertencemos e a Ele devemos voltar. Somente a Ele deve ser dado o tributo total e exclusivo da nossa pessoa. O mais importante não é pagar o imposto ao imperador romano, mas dar a Deus a própria vida e o próprio coração.

Devolvei, pois, a César o que é de César e a Deus, o que é de Deus.”

Como podemos, então, viver esta Palavra de Vida? Renovando o apreço, o senso de responsabilidade e o empenho pela “coisa pública”, respeitando as leis, protegendo a vida, conservando os bens da coletividade: prédios públicos, ruas, meios de transporte… Mas, também, oferecendo a contribuição ativa, crítica e decidida de idéias, propostas, sugestões para um desenvolvimento cada vez melhor do bairro, da cidade, do país, sem ficar esperando de braços cruzados; prestando a nossa ação de voluntariado nas estruturas de saúde, de cidadania; fazendo o nosso trabalho com maior perfeição. Se executarmos as nossas tarefas com competência e amor, poderemos realmente servir Jesus nos irmãos e nas irmãs, e contribuir para que o Estado e a sociedade respondam ao projeto de Deus para a humanidade e estejam plenamente a serviço do homem.

“Devolvei, pois, a César o que é de César e a Deus, o que é de Deus.”

André Ferrari, um contador de Milão (Itália), soube fazer do escritório, no Banco onde trabalhava, o lugar de atuação dessa Palavra de Vida. Ele escreveu: “Toda manhã, quando faltam poucos minutos para as 8:30h, bato o meu cartão, entro no prédio, e começo ali a minha labuta diária. Mas, como é estranho o meu trabalho: ir e vir, subir escadas, esperar diante de portas fechadas, receber e entregar fichas; e isso há tantos anos… Se eu mantiver a caridade, apesar dos contratempos, das cartas a serem refeitas três vezes, terei feito toda a minha parte, porque sinto que foi Jesus mesmo quem me colocou aqui”. “Sou um contador” – dizia ele, dirigindo-se com simplicidade a Jesus – “e te sirvo como contador. Eis a minha vida, Senhor, quero fazer com que ela se torne inteiramente Amor!”. Um dia, uma senhora idosa que, diante do seu guichê, sempre se sentiu tratada não como uma cliente anônima, mas como uma “pessoa”, desejando demonstrar a própria gratidão, lhe trouxe um saquinho de ovos. André morreu aos 31 anos, num hospital de Turim, após um acidente de moto. “Tenho mesmo que morrer assim, sozinho, sem ver ninguém dos meus?” A freira respondeu que era preciso aceitar a Vontade de Deus. Ao ouvir esta palavra, André se reanimou e disse, sorrindo: “Aprendemos a reconhecê-La sempre como nosso Ideal, mesmo nas pequenas coisas,” – e acrescentou, dando uma piscadela com aquele humor que lhe era característico – “inclusive no vermelho de um semáforo”. Ele obedeceu a Deus e naquela obediência de amor foi ao seu encontro.   Chiara Lubich  

Reflexão de Chiara Lubich sobre a Palavra de vida do mês setembro de 2005

Era por volta do ano 50, primeiro século da era cristã, quando Paulo, junto com o companheiro Silas, chegou à cidade de Filipos. Foi a primeira cidade européia em que o apóstolo se deteve para anunciar o Evangelho. A conversão de algumas pessoas gerou descontentamento e desordens na população pagã, a tal ponto que os magistrados decidiram expulsar secretamente Paulo e Silas. Eles tiveram de recorrer aos seus direitos de cidadãos romanos para serem reabilitados.
Poucos anos depois, ao escrever à pequena comunidade cristã nascida em Filipos, apesar das dificuldades com as autoridades civis e com o povo, Paulo convida os fiéis a viver com lealdade e coerência evangélica o próprio empenho civil.
Pouco mais adiante, na mesma carta, Paulo recorda que os cristãos são cidadãos, sim, mas cidadãos do céu. No entanto, isso não os dispensa de assumir suas responsabilidades também no campo social e político. Aliás, justamente por serem cidadãos do reino de Cristo, os cristãos têm uma forte motivação para se colocarem a serviço de todos e contribuírem para a construção da cidade terrena na justiça e no amor:

“Exercei a cidadania de maneira digna do Evangelho de Cristo.”

Portanto, com essa frase o Apóstolo pede aos filipenses que se comportem como verdadeiros cristãos. Às vezes pensamos que o Evangelho não resolve os problemas humanos e que o reino de Deus que ele traz é entendido apenas no sentido religioso. Mas não é assim.

É Jesus no cristão, no homem, naquele determinado homem – quando a sua graça está nele –, que constrói uma ponte, que abre uma estrada… E, como um outro Cristo, cada homem e cada mulher pode dar a sua contribuição específica em todos os campos da atividade humana: na ciência, na arte, na política…

“Exercei a cidadania de maneira digna do Evangelho de Cristo.”

Mas como podemos ser um outro Cristo, chegando a atuar e influir de modo eficaz na sociedade? Vivendo o estilo de vida dele, conforme descrito nas palavras dos Evangelhos. De fato, se acolhermos a sua Palavra, estaremos cada vez mais sintonizados com os seus pensamentos, com os seus sentimentos, com os seus ensinamentos. A Palavra ilumina toda a nossa atividade, retifica e corrige todas as expressões da nossa vida.

Sim, vivendo o Evangelho nos tornaremos outros Cristo, doaremos a vida pelos próximos assim como Ele fez e, vivendo no amor, contribuiremos para a construção da fraternidade. Com efeito, todas as palavras do Evangelho podem ser resumidas no amor a Deus e ao próximo e, quando vividas, elas levam a amar.

Muitas vezes falamos de amor e pode parecer supérfluo salientá-lo também desta vez. Mas nunca é demais. O nosso “homem velho” está realmente sempre pronto a se fechar no seu próprio mundo, a cultivar os pequenos interesses pessoais, a esquecer-se das pessoas que passam ao nosso lado, a ficar indiferente diante do bem público, das exigências da humanidade que nos rodeia.

Portanto, vamos reacender no nosso coração a chama do amor, e assim teremos olhos novos para ver o que acontece ao nosso redor e nos darmos conta das iniciativas necessárias para melhorar a nossa sociedade. No amor encontraremos também as sugestões sobre os caminhos a serem seguidos para agir com criatividade, e a coragem e a força para percorrê-los.

“Exercei a cidadania de maneira digna do Evangelho de Cristo.”

Foi o que fez Ulisse Caglioni, um amigo nosso que consumiu sua vida na Argélia entre cristãos e muçulmanos, testemunhando concretamente e com simplicidade o amor evangélico para com todos.

Não viveu pensando em si mesmo. Para ele, os irmãos e as irmãs ocupavam o primeiro lugar. Dedicava um amor especial a cada um, e não media o próprio tempo, compartilhando as alegrias, conquistas e esperanças, e também as dificuldades, incertezas e sofrimentos das primeiras décadas após a independência do país.

Tanto é que Ulisse decidiu, junto com outros cristãos, não voltar para a Itália, sua terra natal, quando iniciou um período de desordens na região, nos anos 90. O terror não poupou ninguém em toda a população argelina, quase inteiramente muçulmana, e atingiu também a pequena comunidade cristã de origem estrangeira.

Numa entrevista a um jornal ele declarou: “Fiquei na Argélia por muitos anos quando tudo ia bem. Agora, que a situação é delicada e perigosa, não acho que devo sair de lá; ir embora não estaria de acordo com o Evangelho”.

Quando ele partiu para o Céu, em 1º de setembro de 2003, por causa de uma doença, os muçulmanos que tinham vivido ao seu lado testemunharam: “Existia um amor tão grande entre nós, que toda situação era vivida e compartilhada. Ele foi a ponte, a ligação entre o cristianismo e o islã. Num país onde se exaltava a intolerância, aprendemos a escutar, sem preconceitos, sem qualquer julgamento. Ulisse nos ensinou a fazer tudo por amor, a ser o amor”.

 

Chiara Lubich

 

Reflexão de Chiara Lubich sobre a Palavra de vida do mês agosto de 2005

É noite. Os discípulos tentam atravessar o lago de Tiberíades. O barco é agitado pela tempestade e pelo vento contrário. Anteriormente já haviam enfrentado uma situação semelhante, mas o Mestre estava com eles no barco. Dessa vez, não: Ele tinha ficado em terra firme, estava no monte, a rezar.

Mas Jesus não os deixa sozinhos na tempestade. Desce do monte, vai ao encontro deles, caminhando sobre as águas, e os anima: “Coragem! Sou eu. Não tenhais medo!”. Seria realmente Ele ou apenas uma ilusão? Pedro, cheio de dúvida, pede-lhe uma prova: que também ele possa caminhar sobre as águas. Jesus o chama a si. Pedro sai do barco, mas o vento ameaçador o assusta e ele começa a afundar. Então Jesus o segura pela mão, dizendo-lhe:

“Homem fraco de fé, por que duvidaste?”

Também hoje Jesus continua dirigindo-nos estas palavras, toda vez que nos sentimos sós e incapazes nas tempestades que freqüentemente desabam sobre a nossa vida. São doenças ou graves situações familiares, violências, injustiças… que insinuam no coração a dúvida, quando não, até mesmo, a rebelião: “Por que Deus não vê isso? Por que não me escuta? Por que Ele não vem? Por que não intervém? Onde está aquele Deus Amor no qual acreditei? É apenas um fantasma, uma ilusão?”.  

Assim como aconteceu com os discípulos assustados e incrédulos, Jesus continua repetindo agora: “Coragem, sou eu! Não tenham medo”. E assim como Ele desceu do monte daquela vez para estar perto deles nas suas dificuldades, da mesma forma hoje Ele, o Ressuscitado, continua entrando na nossa vida, caminhando ao nosso lado, fazendo-se companheiro. Jamais nos deixa sozinhos na provação: Ele está aí para compartilhá-la conosco. Mas, pode ser que não acreditemos suficientemente; por isso Ele nos repete:

“Homem fraco de fé, por que duvidaste?”

Estas palavras, além de serem uma censura, são um convite a reavivar a fé. Quando Jesus estava na terra conosco, prometeu-nos muitas coisas. Ele disse, por exemplo: “Pedi e recebereis…”; “Buscai em primeiro lugar o reino de Deus e todo o resto virá por acréscimo”; a quem tiver deixado tudo por Ele será dado cem vezes mais nesta vida e como herança a vida eterna.
Podemos obter tudo, mas precisamos acreditar no amor de Deus. Para poder nos dar algo, Jesus pede que pelo menos reconheçamos que Deus nos ama.
Ao passo que muitas vezes nos afligimos como se tivéssemos de enfrentar a vida sozinhos, como se fôssemos órfãos, sem um Pai. Fazemos como Pedro, dando mais atenção às ondas agitadas que parecem nos engolir do que à presença de Jesus que logo nos segura pela mão.
Se ficarmos parados, analisando aquilo que nos faz sofrer, os problemas, as dificuldades, então afundaremos no medo, na angústia, no desencorajamento. Mas não estamos sós! Acreditamos que existe Alguém que cuida de nós. É Nele que devemos fixar o nosso olhar. Ele está perto de nós, mesmo quando não percebemos a sua presença. Precisamos acreditar Nele, confiar nele, confiar-nos a Ele.
Quando a fé passa por uma prova, lutamos, rezamos, do mesmo modo como Pedro, quando gritou: “Senhor, salva-me!”, ou como os discípulos, numa outra situação semelhante: “Mestre, não te importa que estejamos perecendo?” Jesus nunca nos deixará faltar a sua ajuda. O seu amor é verdadeiro e Ele assume todos os nossos pesos.

“Homem fraco de fé, por que duvidaste?”

Também Jean Louis era um jovem “fraco de fé”. Apesar de ser cristão, ele duvidava da existência de Deus, ao contrário dos outros membros da família. Vivia bem longe dos pais, em Man, na Costa do Marfim, com os irmãos menores. 
Quando a cidade foi tomada por rebeldes, quatro deles entraram na sua casa, saquearam tudo e quiseram recrutar à força o jovem, devido ao seu aspecto atlético. Os irmãos menores suplicavam que o soltassem, mas em vão.
Quando já estavam para sair com Jean Louis, o chefe do grupo mudou de idéia e decidiu deixá-lo. Depois sussurrou para a maiorzinha das irmãs: “Vão embora o quanto antes, porque amanhã nós vamos voltar…”. E indicou a direção que eles deveriam tomar.
Seria o caminho certo? Não seria uma armadilha?, perguntaram-se os adolescentes.
Partiram logo ao amanhecer, sem um tostão no bolso, porém com uma migalha de fé. Caminharam por 45 quilômetros. Encontram alguém que lhes pagou uma passagem de caminhão para chegarem até a casa de seus pais. Pelo caminho, foram acolhidos por pessoas desconhecidas que também lhes deram de comer. Nos postos de controle e ao atravessar a fronteira, ninguém lhes pediu documentos, até que finalmente chegaram em casa.
A mãe conta: “Não estavam em boas condições, mas se sentiam arrebatados pelo amor de Deus!”.
A primeira coisa que Jean Louis fez, foi perguntar onde havia uma Igreja. E disse: “Papai, o teu Deus é realmente forte!”

 

Chiara Lubich